OCUPADO

Haja paciência!
OCUPADO

Aniversário do Bernardo. Espero momento ideal para telefonar. Com todo entusiasmo de quem sente alegria em saudar a data, lá vou eu. Estou em Belo Horizonte, ele em Brasília. Nenhum problema porque é pra isso que temos o telefone.
Busco número, disco código de interurbano, satisfação em fazer tal chamada, mas telefone dele está ocupado. Tento de novo, muita emoção, pode ser que eu tenha cometido engano na discagem. Ocupado de novo. Sinal de que engano não cometi. Uma terceira vez vou lá com fé agora vai dar. Continua ocupado. Faltou pouquinho de fé, agora vai dar. Ocupado.
Espero um pouco. Mergulho no minuto que não passa. Distraio com qualquer coisa. Já deu tempo. Disco novamente e ouço novamente o sinal de ocupado.
Quero preciso parabenizar o Bernardo. Finjo sede vou tomar água. Volto, agora vai dar. Disco fingindo calma, sem pressa, não posso errar. Ocupado. Não é possível. Alguém deixou o telefone desligado. E agora? Tento outra vez. Ocupado. Penso em gritar um palavrão, mas não grito. É aniversário do Bernardo. Pego o telefone, busco a tecla memória porque assim não preciso discar tudo de novo. Ocupado. Olho firme para o telefone. Aparelho frio, insensível, distante da minha necessidade.
Disco não disco vou à memória deste aparelho que já nem quero ver. Ouço o ruído de cada toque registro dos números. Paro a respiração e... ocupado.
Desisto. Não? Sim? Mer...danou-se. Se não dou os parabéns, xingar também não xingo.
Última vez. Ocupado.

Belo Horizonte, 07 dezembro 2008

ERA ELA

Esta ovelha cinza é mesmo interessante. A tarde ainda não estava completamente entregue à noite. Fazia frio. Na avenida do Contorno, surpresa vinda em passos ligeiros. Era ela. Aquela que eu queria ver fazia tempo. Mulher exuberante que eu nunca tinha visto antes, pessoalmente.
Sangue passando veloz pelas avenidas veias, artérias e vasos. Coração disparado por aquela passagem rápida. Era ela mesmo. Linda, alegre, elegante. Estava só. É certo que sabia para onde ia. Eu, perdido em meu vagar solitário e secreto. O relógio acusava quase seis horas. Dezoito horas de um dia completamente inesperado. Ela desapareceu. Passou por mim, distraída. Eu atento.
Era noite quando ouvi chover. A ovelha cinza acordada em mim, parecia buscar outra cor. Ela estava linda e só. Meu sonho passeava pela avenida do Contorno.
Coincidência?

Belo Horizonte, 11 julho 2002