SÓ VENDO

Perder tempo já perdi demais
SÓ VENDO

O mundo da voltas sei disso e até posso sentir isso em alguns momentos não menos interessantes. É que entre acontecimento e outro eis que surge aquele objeto, ou aquela pessoa, ou até mesmo aquela notícia de que o que um dia passou por sua cabeça foi embora para aparecer assim de um repente qualquer.
Antes, confesso, ficava até irritado com isso. Hoje não, nem ligo coisa com outra. Deixo pra lá porque no mais das vezes, para ser verdadeiro mesmo, foi melhor não acontecer aquilo que ambicionei por ingenuidade que parece ser eterna companheira da minha vida. Nesse caso escapo evito porque de tanto aturar bobajada fiquei enojado. Isto porque o que tem de homem executivo bobo por aí, não está escrito. Ganham bom dinheiro, aparecem em atendimento a uma vaidade não menos ridícula e assim levam suas vidas. Elas lá eu cá, porque de papo ruim estou farto. Prefiro, de longe, o silencio das camisetas que pinto numa felicidade que só vendo pra acreditar.

Belo Horizonte, 18 dezembro 2008

“BICOTA DE MULATA”

Devo confessar meu mais completo desconhecimento quanto ao sabor da “bicota de mulata”. Um doce sabor mantido sob a mais rígida tradição das grandes doceiras de Santa Luzia. Um doce típico que exige trabalho e talento, para que seu sabor exubere com toda plenitude que merece alcançar. Se a dificuldade começa na obtenção da receita, prossegue na maneira de interpreta-la. Chegar ao resultado ideal da “bicota de mulata” não é simples. Por certo haverá segredo no toque, no manuseio, na maneira como preparar e agregar os ingredientes do tal doce.
Há quem diga estar sua sobrevivência ameaçada. Inconformado, não admito possibilidade de permanecer desconhecido da “bicota de mulata”. Já imagino o formato daqueles lábios, digo doces, a suavidade de sua saliva, ou seja, calda. Engulo seco e perdido em divagações a digerirem meu paladar. Saio à procura da mulata, da bicota, do doce, da doceira e deste instante escondido em Santa Luzia. Tudo porque já não consigo viver, sem a “bicota de mulata”.

Santa Luzia, 13 outubro 2002